Comissão
da Verdade lamenta que Forças Armadas não reconheçam tortura
02/07/2014
17h48Brasília
Helena
Martins - Repórter da Agência Brasil Edição: Luana Lourenço
A
Comissão Nacional da Verdade (CNV) divulgou hoje (2) nota em que afirma que
“deplora e lamenta” a conclusão das Forças Armadas quanto ao uso de instalações
do Exército, da Marinha e da Aeronáutica para prática de tortura em suas
instalações, durante a ditadura militar. Em relatórios enviados à CNV e
divulgados pela comissão no dia 18 de junho, as Forças Armadas concluíram que
não houve desvio de finalidade do uso de suas instalações.
O
coordenador da CNV, Pedro Dallari, disse que a posição dos militares representa
uma posição política contrária à colaboração e à busca da verdade. “Se uma
estrutura do Estado age dessa maneira surpreendente e completamente dissociada
da realidade, que tipo de compromisso tem com a história?”, disse Dallari à
Agência Brasil.
A
conclusão das Forças Armadas foi apresentada após sindicâncias, em resposta à
CNV, que questionou as corporações sobre desvios de finalidade de sete
instalações, alocação de pessoal para o desenvolvimento de atividades nesses
locais, emprego de recursos financeiros públicos para custeio e manutenção
deles, e de que forma foi feita a prestação de contas relativa a esses
recursos, entre outras questões. Exército, Marinha e Aeronáutica negaram
desvios e alegaram que seguiram a lei.
Saiba
Mais
Forças
Armadas não reconhecem tortura em suas instalações
“Os
dados disponíveis não permitem corroborar a tese apresentada por aquela
comissão, de que tenha ocorrido desvio formal de finalidade do fim público
estabelecido para as instalações objeto da investigação”, afirmou, em
documento, o Exército Brasileiro, que não reconheceu que os destacamentos de
operações de informações foram usados para tortura.
Na
nota divulgada hoje, a CNV avalia que as conclusões das sindicâncias estão
equivocadas e que desconsideram inclusive que o Estado brasileiro já
“reconheceu sua responsabilidade por aquelas condutas criminosas de militares e
policiais praticadas durante a ditadura, incorrendo inclusive no pagamento de
indenizações por conta justamente de fatos agora surpreendentemente negados”.
Para
Dallari, a prática de tortura em instalações do Estado brasileiro não é sequer
discutível. “É público e notório”, destacou, acrescentando que o pedido de
informações da CNV enviado em fevereiro, menciona casos de tortura e morte
vivenciados nas instalações e que geraram o pagamento de indenização por parte
do Estado. Uma seleção feita, justamente, para que não houvesse dúvidas sobre o
que ocorreu naqueles locais.
O
coordenador da CNV considera um paradoxo o fato de, no mesmo mês em que a
comissão recebeu a negativa das Forças Armadas, ter recebido também documentos
do Departamento de Estado dos Estados Unidos, produzidos no período de janeiro
de 1967 a dezembro de 1977, que foram tornados públicos hoje, por meio do site
da CNV.
Segundo
Dallari, os arquivos mostram o profundo
conhecimento que se tinha sobre a prática de tortura no Brasil, inclusive nos
locais investigados pelas Forças Armadas a pedido da comissão. Um deles, de
1973, registrado como A-90, detalha o procedimento dos interrogatórios, citando
inclusive os métodos de tortura física ou psíquica e que foram usados para
obter informações.
Na
nota, comissão diz que enviará pedido de esclarecimento ao Ministério da Defesa
sobre as informações e conclusões produzidas pelas sindicâncias. “Nós vamos
continuar perguntando”, disse o coordenador, para quem a situação não só
prejudica o trabalho da CNV, que tem até o mês de dezembro deste ano para
concluir os seus trabalhos, como gera o desgaste das forças diante da
população.