Correios têm um chefe para cada dois servidores e 9 mil
estão em licença-médica
Um racha entre os
funcionários de elite dos Correios e a direção da estatal está abrindo uma
verdadeira caixa-preta. Os principais motivos dessa briga são a mudança, pela
diretoria, do antigo estatuto para contratação de pessoal e reforma da
instituição. Dados obtidos com exclusividade pelo GLOBO mostram, por exemplo,
que há um funcionário comissionado (em cargo de chefia) para cada dois
servidores.
Em meio a divergências internas, os Correios farão concurso
público para contratar 9 mil funcionários, mas têm exatamente a mesma
quantidade em licença-médica, além de 4,5 mil aposentados por invalidez. Há 47
ações na Justiça do Trabalho contra a empresa, sendo a maioria por
descumprimento da legislação, conta a repórter
Geralda Doca.
Os carteiros são obrigados a caminhar até 15 quilômetros por
dia, carregando sacolas com 11kg nas costas – um sistema da década de 70. Um
grupo pequeno usa motos, mas a estatal não paga seguro nem da frota nem
individual, o que obriga o trabalhador a arcar com as despesas do próprio bolso
se for comprovada sua culpa em um acidente. Só em São Paulo, 628 funcionários
têm um passivo a pagar de quase R$ 1 milhão. Com salário bruto de R$ 850, os
trabalhadores da chamada área fim (70% do quadro) recebem quase o mesmo (R$
741) com o auxílio-alimentação, benefício que não conta para aposentadoria nem
FGTS. Sem estímulos, a estatal perde funcionários para outros órgãos.
É o caso do carteiro Maxwell Santos, que está há dois anos
nos Correios, mas já tem um pé fora da empresa. Formado em Química, ele passou
no concurso da Secretaria de Educação do Distrito Federal e espera ser chamado.
– O salário aqui é baixo pelo serviço que a gente faz. Quero
investir na minha carreira – disse ele.
Sistema polêmico gerou gastos de R$ 54 milhões
A estatal quase não tem mulheres (menos de 25% do quadro) e
nenhuma ocupa cargo de direção. O próprio concurso público acaba funcionando
como uma barreira à entrada delas, devido ao rigor no teste físico.
Não existe qualquer critério para criação das chamadas
funções (cargos, chefia e assessoramento), nem definição clara de competências.
Com isso, os Correios têm hoje quase um “chefe” para cada dois trabalhadores:
dos 107,8 mil funcionários do quadro, 51,9 mil têm funções – uma distorção em
comparação à quantidade de servidores do Executivo, no qual exercem cargos de
confiança 21,8 mil de um total de 567,8 mil. Ou seja, um chefe para cada 27
subordinados.
O sistema, criado em 2005, vigorou até janeiro de 2011 – um
gasto estimado em R$ 54,2 milhões ao ano e que beneficiou 19.251 empregados.
Diagnóstico concluído pela atual direção da empresa, em parceria com órgãos de
controle (Controlaria Geral da União-CGU e Tribunal de Contas da União-TCU),
concluiu que o modelo de remuneração de grandes diferenças salariais faz com
que os Correios sejam foco de corrupção.
Há uma enorme distância entre o salário-base e os
vencimentos de quem tem cargo de chefia, que ficam entre R$ 11.750 e R$ 16.462
(comparando aos DAS 4 e 6), que, até recentemente, poderiam virar salário
definitivo. Há, ao todo, 2.800 processos internos de suspeitas de
irregularidade nos Correios, com suposto envolvimento de 1.500 funcionários.
A nova direção tem carta branca da presidente Dilma Rousseff
para moralizar a Casa e está disposta a enfrentar resistências internas. Assim
que for aprovado o novo estatuto no Congresso, a ideia é criar um regimento
interno, revogar todos os manuais e começar do zero no início do próximo ano.
Toda estrutura de cargos e salários será revista, bem como
critérios para cargos de chefia. Está sendo feito um levantamento e quem
recebeu incorporação ilegal poderá ter a obrigação de devolvê-la.
Para o presidente da Associação dos Profissionais de Nível
Superior, Técnico e Médio da ECT (Adcap), Luiz Alberto Barreto, a mudança no
estatuto abre brecha para o aparelhamento da empresa ao permitir a entrada de
pessoas de fora do quadro. Ele disse que pretende atuar no Congresso para que a
direção explique em audiência o novo estatuto.
Fonte:O Globo