PRA INICIO DE CONVERSA -08/11/2012
01-. Diante da cobiça e da violência, os
trabalhadores rurais lutam pela vida e pela esperança.
A intervenção de Luismar Ribeiro Pinto, da
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), foi um
momento de destaque na última reunião do Grupo Profissional dos Trabalhadores
Agrícolas da UITA, ocorrido em Buenos Aires de 22 a 23 de outubro. A seguir
transcrevemos uma síntese de suas palavras, que demonstram que uma coisa é o
êxito do agronegócio brasileiro e outra, muito diferente, é a realidade
sofrida pelos trabalhadores rurais.
“A situação dos assalariados rurais no
Brasil é muito difícil. Temos aproximadamente 5 milhões deles, e quase 65 por
cento estão na informalidade.
Um povo “caixa 2”
A maioria dos trabalhadores com previdência
social se encontra na região sudeste
do Brasil, nos estados de São Paulo,
Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro. Mas a maior parte dos que não
estão devidamente registrados se encontra na região nordeste, que é a mais
pobre do país.
Esta informalidade vem ancorada aos
contratos de trabalho por tempo determinado abrangendo a maioria de nossos
trabalhadores. Somente 2,8 por cento dos que permanecem na informalidade
contam com Previdência Social.
A guerra surda
Existe também uma violência muito grande
contra o trabalhador se considerarmos, como tal, o trabalho escravo. De 1995
a 2011 foram resgatadas 43 mil pessoas nesta condição. Nesse mesmo período,
600 mil trabalhadores estiveram envolvidos em conflitos rurais. Deles, 458
mil lutavam pela terra.
Com relação à violência direta sofrida
pelos trabalhadores - estamos inclusive desenvolvendo uma campanha junto à
UITA sobre este terrível flagelo social-, vemos que só em 2011 foram
assassinados 29 trabalhadores.
Temos, atualmente, 145 companheiros
ameaçados de morte e inúmeros líderes sindicais com processos judiciais
instaurados contra eles. Há uma criminalização progressiva de nossos líderes,
principalmente na região Norte, onde se destaca o estado do Pará.
A violência no Brasil é seletiva, como bem
disse Gerardo (Iglesias) ontem, porque o alvo são aquelas pessoas com algum
nível de liderança entre os
trabalhadores. A violência, além disso, é organizada, porque se percebe uma
participação ou omissão dos organismos do Estado, dificultando a
investigação, impossibilitando chegarmos ao mandante do crime.
O Brasil possui um Poder Judiciário que
fecha os olhos diante desta violência. A impunidade é uma das grandes causas
da violência neste país.
Nos últimos 20 anos foram assassinados
1.385 trabalhadores rurais, dos quais 523 foram mortos no estado do Pará.
Apenas 77 assassinatos foram levados a julgamento, e destes apenas 15
mandantes foram condenados. Entre os executores, cerca de 60 foram condenados.
Entretanto, a maioria destes criminosos não está presa.
Portanto, esta impunidade gera um ambiente
propício para o aumento da violência. Os organismos do Estado, seja a Polícia
ou a Justiça, não conseguem ou não querem investigar e esclarecer os fatos.
A instituição violenta
Outro fator que cria violência é a
concentração da terra. Infelizmente, inclusive durante os governos de
esquerda, a concentração de terras continua aumentando no Brasil.
Isto é contrário a tudo aquilo que
esperávamos conquistar como, por exemplo, uma reforma agrária verdadeiramente
democrática de acesso à terra.
A região Norte sofre um avanço do modelo
econômico porque o grande capital começa a chegar ali com a palma africana (o
dendê), a produção de madeira, mas principalmente com a pecuária.
A razão desta emigração é que com a entrada
do capital internacional na produção de etanol –que ocorre na região
centro-sul- o gado e a produção de grãos estão sendo expulsos para a região
Norte do país. O que prova que é o interesse do capital o que começa a se
impor –ou já está se impondo- nesta região.
Udo Wahlbrink, dirigente sindical da
CONTAG, está preso em Rondônia, acusado de “organizar a luta pela terra”. E
não conseguimos libertá-lo. Já fomos aos tribunais superiores e ele ainda
está preso.
A perseguição é muito grande. Percebe-se
uma frequente e crescente criminalização de nossos líderes rurais e
sindicais.
A violência legal
Os trabalhadores também sofrem um ataque no
Poder Legislativo. São vários os projetos de lei que buscam flexibilizar as
leis trabalhistas, ou seja, terminar com direitos adquiridos desde 1940.
Recentemente foi criada a Lei das
Cooperativas do Trabalho.
A CONTAG se manifestou radicalmente contra
porque, se por um lado trabalha com as cooperativas de produção na
agricultura familiar, por outro não admite uma cooperativa de trabalho, pois
no Brasil só serviram para legitimar o que aqui chamamos “gato”, isto é, o
intermediário da mão de obra que lucra com o suor do trabalhador sem lhe
garantir seus direitos.
Essas cooperativas vão prejudicar
fortemente as negociações coletivas, porque para a patronal será muito mais
vantajoso contratar uma cooperativa sem vínculo de dependência, negociar contratos
individuais e não ter que entrar em acordos dentro de uma Convenção Coletiva
estadual nem regional. Uma coisa como esta impactará fortemente na vida dos
assalariados rurais.
Lutamos pela vida
CONTAG realizou, em 2011, a primeira
mobilização dos assalariados rurais. Conseguimos levar a Brasília 5 mil
assalariados rurais, sendo esta a primeira vez em 50 anos que a CONTAG
conseguiu fazer uma ação desta natureza para os assalariados rurais.
Têm sido feitas manifestações todos os
anos, mas são conjuntas com a agricultura familiar. Esta foi a primeira vez
onde o protagonista exclusivo da mobilização foi o assalariado rural. E
conseguimos apresentar uma pauta ao governo federal, sendo nossa principal
reivindicação a implementação de uma política nacional de proteção para o
assalariado rural.
Reivindicamos a escolarização, a
qualificação, a requalificação e a recolocação do trabalhador que está
perdendo seus postos de trabalho como consequência da mecanização. Esta é
incentivada pelo próprio governo com financiamento do Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), muitas vezes com o dinheiro do
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) do próprio trabalhador,
emprestado às empresas para adquirirem máquinas que substituirão mais trabalhadores.
Estamos lutando por uma política que pense
o conjunto da demanda dos assalariados rurais. Essa proposta de política está
sendo construída com o governo federal, com muitos conflitos, mas está em
processo, com possibilidades, inclusive, de incluir aspectos como moradia,
saúde, educação.
A questão da moradia é delicada, porque 49
por cento de nossos assalariados rurais vivem nas cidades, nas periferias das
cidades. Aqueles que moram na zona rural estão assentados em terras que não
são suas, em terras de outros. Por isso, está sendo estudado um programa de
moradia nesta nova perspectiva, adaptado às necessidades e condições deste
trabalhador.
Exigimos do governo a criação de uma
política de intermediação pública de mão de obra para o campo, porque entendemos
que o “gato” chega ao trabalhador quando o Estado não se faz presente.
Queremos –e já existe um programa piloto
criado- ajudar os trabalhadores que vivem em um processo de migração
constante dentro do país impedindo que caiam em mãos do “gato” ou do trabalho
escravo.
Também estamos trabalhando sobre a
segurança alimentar. Já fizemos um estudo revelando que 40 por cento dos
trabalhadores da cana de açúcar e do café sofrem insegurança alimentar.
Eles não dispõem da energia suficiente
exigida pelo seu trabalho. Ou seja, estamos lutando para concretizar
políticas com soluções para estes problemas enfrentados por nossos
trabalhadores no Brasil”.
O artigo original em espanhol pode ser
visto no site da REL-UITA:
http://www.rel-uita.org/internacional/ddhh/violencia_cero/luismar_ribeiro_pinto-intervencion.htm
FONTE: REL-UITA
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