Perdas podem chegar a US$ 100 bilhões por ano, segundo o BID.
Por Laura Herrera para Infosurhoy.com – 26/12/2012
“Se nada for feito, as produções de sementes oleaginosas e cereais no Brasil (como a soja, acima) serão seriamente afetadas pelo aumento da temperatura”, explica Walter Vergara, chefe da Divisão de Mudanças Climáticas e Sustentabilidade do BID. (Yasuyoshi Chiba/AFP)
GOGOTÁ, Colômbia – Derretimento das geleiras na Cordilheira dos Andes. Branqueamento de corais no mar do Caribe. Níveis extremos de chuva na Colômbia e na bacia do rios Grijalva e Usumacinta, compartilhada pela Guatemala e o México.
Essas são algumas dramáticas evidências do impacto das mudanças climáticas sobre a América Latina e o Caribe (ALC).
Um grupo de estudiosos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em parceria com a World Wildlife Fund (WWF) e a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), procurou quantificar o impacto econômico causado pelas mudanças climáticas na região.
O relatório final, “The Climate and Development Challenge for Latin America and the Caribbean: Options for Climate Resilient Low Carbon Development” (O desafio climático e o desenvolvimento na América Latina e Caribe: Opções para um desenvolvimento resiliente baixo em carbono), aponta que um aumento de 2°C na temperatura em relação aos patamares pré-revolução industrial pode ter um impacto econômico anual de cerca de US$ 100 bilhões até 2050.
O estudo mostra que os maiores prejuízos virão da queda na exportação de produtos agrícolas, o aumento do nível do mar, a redução da produção hidroenergética no Brasil, o branqueamento de corais e a perda da biomassa da floresta Amazônica.
A cifra bilionária não inclui a perda da biodiversidade da região, que abriga seis dos países mais ricos do mundo em diversidade de fauna e flora: Brasil, Peru, Colômbia, Equador, Venezuela e México.
Derretimento das geleiras
Já o derretimento das geleiras nos Andes pode afetar a oferta de água nas cidades e na agricultura, entre outros impactos.
No Chile, 70% da água fornecida à população têm origem nas geleiras, segundo documento publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA).
“Os glaciares tropicais dos Andes estão derretendo numa velocidade que pode comprometer as geleiras abaixo dos 5.000 metros do nível do mar nos próximos 20 anos”, afirma Walter Vergara, chefe da Divisão de Mudanças Climáticas e Sustentabilidade do BID e líder do estudo. “Somente nas duas últimas décadas, aproximadamente 25% das geleiras remanescentes desapareceram.”
O consequente aumento do nível do mar poderia ameaçar manguezais, comprometendo o berço de diversas espécies em países como Equador, Brasil e Colômbia.
Além disso, o fenômeno traria danos à infraestrutura, como estradas e portos, e às moradias, aponta o estudo do BID.
Segundo o Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (UN-Habitat), a América Latina e o Caribe concentram 27% das 3.351 cidades localizadas a menos de 10 metros do nível do mar.
Somente na região do Caribe, o aumento de 1 metro no nível do mar custaria US$ 68,2 bilhões até 2080 – ou 8,3% do PIB no período –, referentes a custos de reconstrução de infraestrutura, relocação e perda de território, de acordo com o relatório “Turn Down the Heat” (Reduza o Calor), publicado pelo Banco Mundial em novembro.
As mudanças climáticas provocariam alterações nas características do solo e nos níveis de precipitação pluviométrica, afetando o cultivo de trigo e sementes oleaginosas, como a soja.
O derretimento das geleiras nos Andes pode afetar a oferta de água nas cidades e na agricultura. (Andina/AFP)
“Se nada for feito, as produções de sementes oleaginosas e cereais no Brasil serão seriamente afetadas pelo aumento da temperatura”, explica Vergara.
As perdas anuais nas exportações agrícolas da região são estimadas entre US$ 32 bilhões e US$ 54 bilhões até 2050, segundo o estudo do BID.
Para Vergara, o impacto na Amazônia é a mais importante consequência das mudanças climáticas na América do Sul.
Conhecida no meio internacional científico como “Amazon dieback”, a perda da biomassa amazônica como resultado das mudanças climáticas poderia ter, como uma de suas consequências, a redução de água para agricultura.
“Se o Amazon dieback acontecer, e há evidências de que já acontece, a quantidade de água que a floresta injeta na atmosfera seria impactada, podendo afetar a agricultura no sul do Brasil, norte da Argentina e Uruguai”, diz Vergara. “O impacto na bacia Amazônica tem consequência local, regional e global.”
Vulnerabilidade da região
As mudanças climáticas vão provocar um impacto significativo na região porque suas consequências somam-se a outros impactos decorrentes das atividades humanas.
“O desmatamento, a poluição e a expansão urbana também representam uma grande ameaça à qualidade de vida na América Latina”, afirma Rodney Martínez, diretor do Centro Internacional para Investigação do Fenômeno El Niño (Ciifen), que fica no Equador.
A vulnerabilidade a esses impactos não depende exclusivamente de fatores geográficos.
“Os grandes desafios que tornam a região tão vulnerável estão relacionados à governança, aos fatores sociais e econômicos, como nível de pobreza, e à dependência regional dos recursos naturais”, afirma Martínez.
Na América Latina e Caribe, 149 milhões de pessoas vivem com menos de US$ 4 diários, de acordo com o Banco Mundial.
“A pobreza e a desigualdade, males persistentes na região apesar do crescimento econômico, podem ser agravadas com os impactos das mudanças climáticas”, diz Mayte Gonzalez, consultora do projeto REGATTA (Portal Regional para Transferência de Tecnologia e Ação Frente às Mudanças Climáticas na América Latina e Caribe), do Panamá.
Respostas regionais
O REGATTA, promovido pelo PNUMA com apoio financeiro dos governos da Espanha, Noruega e Suécia, mapeou 250 instituições que fazem algum trabalho relacionado com o tema das mudanças climáticas na região.
Em novembro, o congresso “Cidades e Mudanças Climáticas” reuniu em Bogotá, capital da Colômbia, delegações de países da região para discutir caminhos para a economia de baixo carbono, com enfoque nos centros urbanos.
No evento, 16 cidades somaram-se às 285 que já assinaram o Pacto Climático Mundial das Cidades.
Os signatários comprometem-se, entre outras coisas, a reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa.
“Neste momento, o enfoque deve ser alimentar, do ponto de vista científico, de financiamento e de formação de redes, para que sejam criadas as respostas locais para o benefício das comunidades”, diz Martínez.
A América Latina e Caribe também vão contar com ajuda externa. Em 4 de dezembro, por exemplo, o governo britânico anunciou uma ajuda de £ 15 milhões até 2015 para promover a agricultura sustentável na Colômbia.
“Muitos países da região, por não serem grandes emissores e estarem vulneráveis, devem receber recursos de cooperação multilateral e bilateral”, diz Mayte.
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