Ministério Público quer intervenção judicial no Hospital
do Seridó
Inquéritos civis investigam mortes de gestantes e bebês,
péssimas condições estruturais e sanitárias, além de falhas graves no
atendimento à população
Os Ministérios Públicos Federal (MPF) e Estadual em Caicó
ajuizaram na terça-feira, 2 de junho, uma ação civil pública contra a Fundação
Hospitalar Doutor Carlindo Dantas, mantenedora do Hospital do Seridó, e contra
o Município de Caicó em razão das péssimas condições de funcionamento do
hospital, o único que presta assistência materno-infantil para uma população de
13 municípios da região. Atualmente, tramitam no Ministério Público Estadual em
Caicó cinco inquéritos civis que apuram uma série de irregularidades, que
levaram à morte de três parturientes e dois bebês.
De acordo com a ação conjunta, é frequente o recebimento
de denúncias, tanto pela Procuradoria da República no Município, quanto na
Promotoria de Justiça, relatando problemas. Os depoimentos colhidos pelo
Ministério Público revelam ausência de avaliação médica quando da chegada das
gestantes à urgência do hospital, sendo recebidas por enfermeiras ou parteiras;
negativa de atendimento médico por encontrar-se dormindo o médico plantonista;
falta de assistência nos leitos de urgência, chegando uma paciente, com
hemorragia, a ter seu bebê dentro do banheiro, sem nenhum profissional para dar
suporte. Isso, somado às deficiências estruturais e de equipamentos, bem como à
insuficiência de profissionais indispensáveis ao atendimento obstétrico.
“Da análise das informações colhidas nos autos dos
procedimentos em trâmite para investigação dessas denúncias, foi possível
compilar inúmeros fatos que demonstram a fragilidade do serviço prestado por
essa unidade hospitalar, que já perdura há anos, com danos irreparáveis à
população seridoense, pois tem resultado em mortes de gestantes e neonatos, sem
que os dirigentes da Fundação Carlindo Dantas esbocem qualquer reação gerencial
minimamente capaz de reverter tão grave realidade”, destaca a ação.
Para o Ministério Público, o Município de Caicó também é
responsável pela situação pois não poderia permitir que os serviços de saúde
ofertados em seu território, se deem em condições tão precárias, pondo em risco
a integridade dos usuários que lá são atendidos. “A ausência do município tem
ocasionado o maior de todos os danos: a própria aniquilação dos direitos de
gestantes e bebês, com os vários eventos de mortes lá ocorridos”, destacam os
autores da ação.
A ação do Ministério Público pede, com urgência, a
decretação de intervenção judicial na Fundação Dr. Carlindo Dantas, por um
prazo de 180 dias. Além disso, pede o afastamento por completo da fundação da
gestão do Hospital do Seridó para que o Município assuma definitivamente os
serviços de assistência médico-hospitalar ofertados no hospital, obrigando-se o
ente municipal a adotar todas as providências administrativas e
orçamentário-financeiras cabíveis para inserir o serviço em sua rede de saúde.
A Ação Civil Pública nº 0800164-42.2015.4.05.8402 tramita
perante a 9ª Vara da Justiça Federal.
Óbitos – O Inquérito Civil nº 06.2014.00002662-2
investiga falhas no atendimento realizado à gestante Danúbia da Silva Noberto,
que veio a óbito em 8 de setembro de 2013, 11 dias após a realização de um
parto fórceps no Hospital do Seridó. Conforme o termo de declarações da mãe da
gestante, a gestação era de alto risco e teve o acompanhamento de uma médica
obstétrica, tendo seu parto sido realizado na fundação hospitalar em 28 de
setembro de 2013.
Dentre as alegações contidas no termo de declarações,
tem-se que Danúbia, na data do seu parto, mesmo apresentando quatro centímetros
de dilatação do colo do útero e forte sangramento, não fora internada
imediatamente, tendo o profissional médico a encaminhado para casa; porém a
gestante voltou à unidade, a meia-noite do mesmo dia, sentindo fortes dores,
quando, só então, foi providenciado seu internamento. Foi realizado na paciente
um parto fórceps e não foi informado a sua família. Dois dias após, a paciente
recebeu alta, porém voltou a sentir fortes dores, o que foi diagnosticado como
uma infecção urinária, vindo a óbito, tendo como causa uma septicemia. No termo
de declaração destaca-se que o atendimento médico não foi rápido, e houve
demora no diagnóstico por problemas na assistência recebida pela paciente.
Essa situação foi investigada pelo Conselho Municipal dos
Direitos das Mulheres, resultando em um relatório de visita elaborado pela
Comissão de Fiscalização e Denúncias, no qual há relatos da mãe da puérpera
sobre negligência médica e hospitalar no atendimento de sua filha.
Um outro caso também investigado é o da morte de Maria
Vilma Gonçalves da Silva, 39 anos, natural do município de São Fernando, e de
seu bebê. O fato ocorreu no dia 23 de setembro de 2014, no Hospital do Seridó.
De acordo com as informações colhidas no Procedimento Preparatório nº
06.2014.0006508-1, Maria estava no segundo trimestre de gravidez e chegou ao
hospital na madrugada do dia 23 de setembro de 2014, sentindo fortes dores, mas
foi avisada de que o médico de plantão estava dormindo e que, por isso, só
seria atendida pelo obstetra quando amanhecesse o dia.
Conforme depoimentos do marido da Maria Vilma e de sua
acompanhante, esta teria recebido atendimento médico apenas após as seis horas
da manhã, momento em que deu à luz, tendo seu bebê nascido no banheiro da
enfermaria do Hospital do Seridó, numa das idas da gestante ao cômodo, sem
qualquer assistência de médico ou enfermeira.
Após o nascimento é que a enfermeira dirigiu-se ao
banheiro e ali mesmo cortou o cordão umbilical e envolveu a criança em um saco
de pano. Embora apresentando forte hemorragia, não houve avaliação médica,
segundo as declarações. Em função do sangramento, foi transferida para o
Hospital Regional do Seridó, mas já teria sido encaminhada morta.
Já o Procedimento Preparatório nº 06.2015.00000604-1
investiga morte de parturiente e bebê, ocorridas no Hospital Regional do
Seridó, em 26 de janeiro de 2015. De acordo com denúncia realizada pelo
Presidente do Conselho Municipal de Saúde de Caicó, no dia 26 de janeiro de
2015, a gestante Josana Varela Pessoa fora levada ao Hospital Regional do
Seridó, uma vez que apresentava quadro de parada cardiorrespiratória.
Em 26 de janeiro de 2015, mais um caso no Hospital
Regional do Seridó. Desta vez, as vítimas foram a gestante Josana Varela Pessoa
e seu filho. No Procedimento Preparatório nº 06.2015.00000604-1, que investiga
esse caso, consta que Josana chegou a unidade de saúde com um quadro de parada
cardiorrespiratória.
De acordo com a denúncia, realizada pelo Presidente do
Conselho Municipal de Saúde de Caicó, ao chegar ao hospital, já em choque,
tentaram a transferência da gestante para o Hospital do Seridó, a fim de que
fosse realizada uma cesária de urgência para salvar a vida do bebê. No entanto,
o Hospital do Seridó negou, por duas vezes, o recebimento da paciente, sob
alegação de que não tinha condições de recebê-la, diante da gravidade de seu
estado. O Hospital, então, encaminhou a grávida para Natal, conforme consta no
relatório sobre o óbito elaborado pelo Comitê de Mortalidade Materna Regional,
o que foi confirmado pelas declarações do médico plantonista do Hospital
Regional do Seridó que fez o primeiro atendimento da gestante.
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