Aneel muda cobrança de encargo e conta de luz deve ficar 8% mais cara
Medida pode ter repasse anual de R$ 1,6 bilhão ao consumidor residencial.
Agência teve que alterar o rateio da CDE para cumprir decisão judicial.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou nesta ontem (24) uma nova metodologia de cobrança da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que é um encargo cobrado nas contas de luz. Parte da conta, que até então era paga pelas indústrias, será repassada aos consumidores residenciais, o que pode representar uma alta de até 8% nas contas de luz.
O impacto no bolso do consumidor será sentido quando autorizado o reajuste tarifário anual de cada distribuidora de energia.
A Aneel tentou derrubar a liminar, mas teve o primeiro pedido negado pela Justiça. A agência, no entanto, promete seguir na batalha judicial para tentar reverter a decisão.
A agência se viu obrigada a rever as regras de cobrança da CDE devido a uma decisão judicial que desobrigou as empresas de arcar com os valores, movida pela Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace). A entidade alegou “ilegalidade” no sistema de cobrança atual.
“Não é do meu intento, não é do intento da Aneel, mas a decisão judicial tem que ser cumprida”, disse o relator do processo, André Pepitone da Nóbrega, na reunião da diretoria do órgão que aprovou a nova metodologia.
Repasse de R$ 1,6 bilhão
Pelos cálculos da agência, o cumprimento da decisão judicial levará ao repasse anual de R$ 1,6 bilhão aos consumidores residenciais. Inicialmente, o valor será pago pelas distribuidoras de energia, que poderão repassá-lo aos consumidores por meio de reajustes das tarifas.
Já a indústria fica desobrigada a arcar com os valores de forma retroativa a 3 de julho deste ano, que é a data da obtenção da liminar na Justiça.
Os recursos destinados à CDE compõem um fundo de investimentos para o setor, aplicado, por exemplo, no financiamento de ações do governo, como o programa Luz para Todos e subsídios à tarifa de famílias de baixa renda. O fundo, no valor de R$ 18,9 bilhões ao ano, é gerido pela Eletrobras, vinculada ao Ministério de Minas e Energia.
Leia abaixo o posicionamento da Abrace sobre a decisão da Aneel em relação à CDE:
A Associação Brasileira dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (ABRACE) informa sobre a divulgação de hoje da Aneel sobre sua intenção de reajustar tarifas para cumprir decisão judicial da 2a Vara Federal de Brasília datada 3 de julho de 2015 que:
- A decisão liminar atendeu questionamento da ABRACE sobre parcela de custos da CDE transferida indevidamente para a indústria em prejuízo da competitividade do País, da produção e do emprego.
- O aumento das tarifas anunciado pela Aneel não é uma decorrência da decisão judicial emitida em favor da ABRACE, mas de uma opção feita pelo próprio regulador. Essa decisão trará impacto no caixa das distribuidoras no curtíssimo prazo e na conta de energia dos consumidores a partir dos próximos reajustes.
- A ABRACE questionou judicialmente, diante do orçamento da CDE de 2015, itens de despesa que não deveriam ser pagos por nenhum consumidor (residencial, comercial ou industrial). Um dos exemplos mais gritantes são os custos da construção do gasoduto Coari-Manaus, considerados superfaturados conforme relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), de acordo com as investigações da Operação Lava Jato e, inclusive, apuração feita pela própria ANEEL, em um processo administrativo que está em andamento.
- Segundo cálculos da ABRACE, auditados por consultoria independente, esses itens de despesas indevidas, que não deveriam ser pagos por nenhum consumidor, podem superar R$ 2,5 bilhões – que corresponderiam a cerca de 10% de todo orçamento da CDE para o ano de 2015.
- Já a liminar obtida no processo judicial, que foi deferida em julho/2015, desonera as associadas da ABRACE de valores entre R$ 800 milhões e R$ 1,35 bilhão até dezembro, a depender do critério de cálculo (seja metodologia da Aneel ou da ABRACE). Esses valores correspondem a custos que foram transferidos, na visão da ABRACE, sem cobertura legal.
- Portanto, se a ANEEL, ao cumprir a liminar, tivesse retirado da CDE os itens de despesa apontados como indevidos e sem cobertura legal, haveria redução das tarifas de todos os consumidores, pois a diminuição do custo total da Conta seria superior a qualquer desoneração dos associados da ABRACE. Esse encaminhamento também preservaria as distribuidoras de impactos adicionais e de difícil absorção, ainda que transitórios, em seus caixas. Mantida a decisão da agência, esta oportunidade pode ter sido perdida hoje, no encerramento da audiência pública 57/2015 caso a Aneel não reveja seu entendimento.
- Para evitar a judicialização do assunto por outros consumidores, a Agência deveria se antecipar e sanear a CDE, fixada em mais de R$ 18 bilhões a partir de meras tabelas de custos apresentada pela Eletrobras e não auditadas com profundidade.
- Vale destacar que a Aneel tem plena competência para retirar esses itens de despesa da CDE, pois, de acordo com a legislação, cabe à Agência tanto calcular as cotas anuais do encargo quanto fiscalizar a movimentação da CDE.
- A ABRACE ressalta que em momento algum pediu para que os demais consumidores ou as distribuidoras fossem onerados. A decisão liminar também não indicou alocação de custos sobre distribuidoras ou consumidores, mas, ao contrário, determinou a citação da Eletrobras e consignou expressamente que “a decisão a causa repercutirá nos compromissos e na gestão dos recursos da CDE a seu cargo”.
- Conforme o texto da liminar, se a decisão da causa repercutirá nos compromissos e gestão dos recursos da CDE a cargo da Eletrobrás, não haveria espaço para que a Aneel transferisse os efeitos da liminar para transmissoras e distribuidoras.
- Por fim, as afirmativas dispostas acima podem ser resumidas em trecho da decisão do Presidente do TRF da 1a Região, Desembargador Federal Cândido Mendes, em 20 de agosto: “...A grave lesão à ordem e à economia, neste caso, não decorre da decisão impugnada [pela Aneel], mas, principalmente, das opções políticas na gestão energética...”.
Brasília, 24 de setembro de 2015.